A empatia entre Abiul e o Grupo de Vila Franca è algo de longa data. Podem existir muitas teorias acerca desse facto, mas o que me ocorre são principalmente duas, a diferenciação – Abiul, tal como o Grupo de Vila Franca, marcam pela diferença em relação aos lugares comuns – e a grande afición e amizade desta gente para com o Grupo de Vila Franca, em especial os dinâmicos e incansáveis senhores Agostinho e Carrasqueira, que desde longa data transformaram aquele muito bem cuidado tauródromo e a sua sempre bem montada feira taurina numa referência nacional. Ao chegar a Abiul, cerca de 1 hora antes da corrida, chovia com alguma intensidade mas isso não impedia que nas portas da praça se concentrassem já alguns aglomerados de pessoas, munidas do respetivo chapéu de chuva, aguardando a abertura das mesma. Felizmente a chuva parou uns minutos antes e todos poderíamos presenciar o espetáculo com maior conforto, já que não acredito que mesmo com chuva, este não se realizasse (a tal diferença, noutros locais cancelavam o evento sem dó nem piedade).
Foi com cerca de 3/4 de casa preenchidos e um tempo algo incerto que se iniciou uma corrida aguardada com alguma expetativa, mais não fosse pelo facto do Grupo ir enfrentar 6 Passanhas, com excelente apresentação, algo que esta empresa faz sempre questão em disponibilizar na sua praça. Já no fardamento o cabo Ricardo Castelo havia lembrado o respeito que os forcados a fardar deveria ter para com os toiros e com o publico de Abiul, merecedores do melhor empenho que o Grupo pudesse oferecer. No final, veio-se a confirmar que não foram palavras vãs e que não caíram em “saco rôto”, já que o Grupo presenteou a afición local com uma exibição de altíssimo nível frente a este excelente curro, cujos pesos variaram entre os 520 e os 590 Kg.
O Cabo Ricardo Castelo mais uma vez abriu praça, após brindar à empresa de Abiul, e na sequência das suas exibições desta época, esteve imaculado. Compreendeu perfeitamente o toiro e desfrutou disso, citando com arte, carregando na altura certa e nem o facto de o toiro ter iniciado a investida no preciso momento em que carregava lhe retirou a linha de raciocinio do que pretendia fazer. Recuou e recebeu na medida exacta, já que encheu a cara ao toiro que apenas já perto das tábuas e de um desvio de trajetória para a sua esquerda tentou alguma resistência, completamente aniquilada pela coesão com que o Grupo ajudou.
O segundo toiro da noite foi o mais pesado da corrida, com 590 Kg e saltou para a arena, como forcado da cara, o Flávio Henriques “Moguelas”. Com a sua habitual serenidade subiu aos terrenos adequados para mandar na investida. Após receber o toiro, a mangada inicial acabou por o descompor um pouco na cara, mas a intervenção “enorme” do Emanuel Matos “Manu” foi cirúrgica, compondo o forcado na cara do toiro e sendo crucial para o sucesso da pega, já que o toiro fugiu ao Grupo que posteriormente acabou por recuperar, mas o “Manu” esteve sempre montado.
O terceiro toiro foi o mais reservado da corrida mas não aparentava quaisquer sinais de mansidão óbvia ou maldade saltando à arena o forcado Márcio Francisco para o pegar de caras. Esteve tecnicamente perfeito frente ao toiro e também os ajudas não falharam, apesar do toiro desviar ao grupo, com excelente apoio inicial do primeiro ajuda Tiago Oliveira “Salsa” e uma boa entrada do rabejador Carlos Silva “do Sobral”.
No intervalo da corrida, foi descerrada uma lápide nas arcadas da Praça, homenageando o Grupo de Vila Franca pela celebração dos seu 80 anos de fundação. Mais um acto simbólico que demonstra a grande amizade que une Abiul ao Grupo de Vila Franca.
A abrir a segunda parte da corrida, Bruno Casquinha foi o forcado da cara eleito para efetuar a quarta pega da tarde e não deixou os seus créditos por mãos alheias, consumando mais uma boa pega à primeira tentativa num toiro que desviou a rota no meio do Grupo mas onde uma oportuna entrada do Wilson “PJ” ajudou bastante ao sucesso desta pega.
No quinto toiro, o cabo escolheu o seu irmão Pedro Castelo para efetuar a pega a um toiro bastante fustigado por várias “trapadas” excessivas dos bandarilheiros e algum defeito de visão. Foi por demais evidente este facto, o toiro nunca se quadrou com o cara e estando já o Pedro em terrenos de compromisso, teve de carregar a investida mesmo nessas circunstâncias, o que provocou uma investida algo descomposta, mas que o forcado da cara aguentou muito bem e contando com a eficaz ajuda do Ivo Carvalho para lhe dar o aconchego necessário. O Grupo foi mais uma vez pronto a ajudar e estava consumada a ultima pega de caras da noite.
Para o ultimo toiro da noite, o cabo já havia optado por ser efetuada uma pega de cernelha, não como recurso, já que se tratava de um toiro com bom tipo para uma pega de caras, mas por uma questão de opção. Saltou o Ivo Carvalho para cernelhar e o Carlos Silva “do Sobral” para rabejar. Foram tendo a paciência necessária já que o toiro raramente entrava nos cabrestos, todos mais baixos que o toiro. Após um momento em que a coordenação não foi a ideal e apenas o Carlos se chegou ao rabo, foi necessário mais alguma paciência para finalmente, com decisão, entrarem com a vontade de cumprir a tarefa. Há um momento inicial em que o toiro roda para fora e com alguma facilidade se alivia no cernelheiro que com muita alma, vai buscar força e alento suficientes para recuperar posição e em poucos segundos, conseguem vencer o toiro e pará-lo. Uma boa cernelha a demonstrar que para além do João Maria, o Ivo Carvalho também está preparado para ser uma boa opção nesta difícil posição.
No final da corrida, justa chamada à praça de todo o Grupo que agradeceu nos médios a generosidade do público de Abiul.
A melhor parte deste dia ficou incompleta já que 10 minutos depois de finalizar a corrida, choveu torrencialmente durante horas e para infortúnio de todos, o tradicional bailarico nas imediações do coreto, acabou por terminar prematuramente. Valeu um jantar (muito) regado e onde até deu para discursos, já que ali estávamos nós e grande quantidade de bebida, retidos pela chuva, logo, acabámos por nos distrair com algo diferente desta vez (por ser Abiul, claro está).
Paulo Paulino “Bacalhau”