Vivem-se tempos estranhos. Tempos que não vão deixar saudades nem vão ser referência em qualquer réstia de positivismo que se possa tentar aproveitar neles. A tauromaquia apenas deve às pessoas de bem o pouco de bem lhe tem acontecido, o (maioritáriamente mau) resto são atropelos de direitos e vãs tentativas de formatação por parte de umas escassas mentes vazias. Somos mais fortes que isso, somos mais tolerantes e decididos que os incapazes que nos tentam subjugar e a mensagem vai sendo escrita em cada dia em que a tauromaquia sai à rua, em cada dia que as palmas ecoam numa praça de toiros e em cada dia que nos vacinamos contra a esta paranoia “Orweliana” de gente que nunca conhecerá a essência e o virtuosismo desta arte e cultura tão nossa e tão restritiva aos maus exemplos que a circundam, quais abutres a mirar a agonia da presa indefesa e à espera do momento certo para se banquetear. Bem podem esperar sentados, nós ainda comandamos a nossa mente, logo, alimentem-se de vós próprios nessa obediência aos impulsos cínicos criados pela areia que vos enche a parte superior do crânio.
Em Vila Franca de Xira, neste início de temporada, escreveram-se mais duas mensagens de esperança neste caminho que ainda é longo e penoso para fazer valer a razão da inteligência sobre a insensatez da “força bruta”.
Na sexta feira 7 de maio, a Palha Blanco reabriu as suas portas aos aficionados e foi da porta dos sustos que voltaram a sair toiros “com verdade” para mais um espetáculo que serviu para vencer algum misto de ansiedade e saudade para uns e reencontrar a alegria de fazer o que se gosta em liberdade para outros.
Um curro de António Silva digno de uma praça de primeira foi o polo aglutinador nesta inauguração de temporada da Palha Blanco e o Grupo de Vila Franca teve um desafio à altura, para este grupo que atravessa uma nova fase de renovação, na linha de muitas outras que têm surgido na sua frente, no fundo, ciclos naturais para um grupo que conta com um historial riquíssimo, suportado por recursos que felizmente lhe vão garantido uma continuidade e qualidade a toda a prova nos períodos em que necessita de se reinventar.
O 2º toiro da tarde com 520 Kg cumpriu em toda a lide, com investidas francas e alegres. Para a cara deste astado, saltou à praça o cabo Vaso Pereira, forcado de créditos firmados, que soube “trabalhar” bem a investida nos terrenos No 1º toiro da tarde/noite com 570 Kg de apresentação irrepreensível como os restantes, mais desigual no comportamento, com um génio encastado onde variou algumas investidas não muito consequentes com alguma tendência para tábuas, criando alguma dificuldade de ligação na lide de António Telles, mas sem maldade e a empregar-se nos “apertos”. Um jovem desta nova geração saltou para a cara deste toiro, o forcado Luis Valença que já deixara um bom “perfume” na última feira de outubro e que brindou a sua pega ao cabo do grupo de Alcochete, Nuno Santana. Recebeu a entrada forte do toiro, depois de bem toureado na cara e foi com alguma perplexidade que a pega se gorou já no meio do grupo, onde faltou alguma concentração necessária para esta pega se consumar logo nesta tentativa. Na 2ª tentativa, o Luis voltou a demonstrar a mesma atitude e competência e desta vez o resto do grupo correspondeu ao mesmo nível. Este forcado está no bom caminho, um sinal muito positivo nesta renovação já atrás comentada.
O 3º toiro saído à praça, 615 Kg de Silva cumpriu bem na lide, foi sério, a pedir meças em cada momento e a poder com tudo, um “guerreiro” que transmitiu para a bancada, no fundo, o que nos toca quando estamos numa praça de toiros. Para a cara deste magnífico exemplar, o cara escolhido foi o David Moreira “Canário”. Não era a tarde que esperava ter. Alguma falta de “mando” nas 2 tentativas iniciais fizeram-lhe sentir na pele a brutalidade do Silva. Na 2ª tentativa, o rabejador Carlos Silva esteve imponente num quite oportuno que livrou o Canário de uma colhida certa. Na 3ª tentativa, já em terrenos mais curtos e com o João Maria Santos a “acamar” o forcado da cara na reunião poderosa do toiro, este entrou pelo grupo dentro com o Canário bem fechado e o grupo correspondeu com competência na única vez que tal se proporcionou e assim se consumou a 2ª pega da tarde para o grupo de Vila Franca.
Para encerrar a atuação, o 5º deste final de tarde, outro Silva com 610 Kg de toiro, boa estampa, comportamento comprometedor e que acabou por ser o que saiu a menos de todo o curro no referido nível comportamental. A perigosidade estava lá, era muita, toiro sério e a exigir grupo. Para a cara deste oponente, o Guilherme Dotti, outro jovem desta nova geração mas que já está num patamar bem acima da média e que triunfou na ultima feira de outubro. Esteve decidido e fez tudo como deve ser na cara do toiro, recebeu e fechou-se bem, entrando numa viagem veloz a descair para a esquerda do grupo, até à zona das tábuas, altura em que o toiro foge definitivamente ao grupo, com o Guilherme em solitário na cara e a sair ingloriamente, após uma série de derrotes impossíveis de aguentar. Na 2ª tentativa, a mesma atitude e competência do Guilherme, e o toiro a fazer exatamente o mesmo na viagem, contornando o grupo pela esquerda, mas desta vez, houve prontidão em alguns ajudas já avisados da tentativa anterior e que recuperaram, conseguindo apoiar o Guilherme a aguentar mais uma série de derrotes nesta fuga desenfreada do toiro ao grupo. Consumou-se assim em ambiente apoteótico a exibição desta 1ª corrida do grupo de forcados amadores de Vila Franca de Xira na temporada 2021.
Paulo Paulino